Grandes Obras

O diário de uma juíza

O diário de uma juíza



Década passada, era um veranico de maio, dia do meu aniversário de 37 anos. Meu humor não estava lá essas coisas, meu casamento estava frio e turbulento. Naquela manhã, ao acordar, fui à copa da casa para tomar café. Tinha a expectativa de que meu marido dissesse: “Feliz aniversário, querida”. Mas ele nem me disse “bom dia”. Aí pensei interrogativa: “Esse é o homem que eu mereço?”…

Saí de casa desanimada, mas me senti um pouco melhor quando entrei no fórum. O Miguel, meu estagiário, foi receptivo: “Bom dia, doutora, feliz aniversário!”. Ele estendeu a mão, deu-me um abraço respeitoso. Finalmente alguém havia lembrado do meu aniversário.

Trabalhei até o meio-dia, quando Miguel entrou na minha sala dizendo: “Doutora, está um dia lindo lá fora. Não temos audiências à tarde. E já que é o dia do seu aniversário, pergunto se podemos almoçar juntos? Só a senhora e eu!”.

Achei estranho, mas concordei. Fomos a um lugar reservado. Falamos em processos, mas a conversa também foi divertida. No caminho de volta, ele sugeriu: “Nesta tarde tão linda, de seu aniversário, sugiro não irmos ao fórum”…

Senti o clima, abri um sorriso sutil, mas contido, e o Miguel parecia ter avançado o sinal: “Vamos até o meu apartamento tomar um drinque refrescante”…

Fomos, sentamos na sala. E enquanto eu saboreava um martini gelado, ele pediu: “Se não se importar, vou ao meu quarto vestir uma roupa mais confortável”…

– Tudo bem – respondi. Fica à vontade!

Uns três minutos depois, ele saiu do quarto, carregando um bolo enorme. Atrás dele, meu marido, algumas amigas e quase todo o pessoal da vara. Todos cantando, ‘Parabéns pra você… ‘

Lá estava eu, sentada no sofá, numa sensual posição, saia mais curta, meia coxa à mostra.

No dia seguinte, eu demiti o Miguel, após analisar um refrão forense de que “estagiário só faz merda”. E de imediato entrei em férias. Também obtive a minha transferência para outra comarca. E não se fala mais nisso.

…..

(A ficção acima é criação de Carlos Alberto Bencke, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e advogado).

 

Digitação fingida

O Banco Wells Fargo demitiu na sexta-feira, dia 14 de junho, nos EUA, 12 funcionários que fingiam digitar para parecer que estavam trabalhando. Eles foram “demitidos após análise de alegações envolvendo simulação de atividade de teclado, criando a impressão de trabalho ativo”. O teor consta de documento enviado à autoridade reguladora da indústria financeira estadunidense. O banco afirmou que “exige os mais altos padrões e não tolera comportamento antiético”.

Embora o Wells Fargo – que é o terceiro maior banco do país – não tenha referido a forma como os funcionários simulavam o trabalho, existem técnicas disponíveis para tal chamada fraude presencial. Uma das ferramentas que algumas das 12 pessoas supostamente usaram foi um “movedor de mouse” para que a atividade no dispositivo fosse registrada. Os “clickers” de teclado simulam a digitação individual. Na prática, uma máquina está pressionando botões aleatórios no teclado de um dispositivo. As ferramentas estão disponíveis para compra online – e algumas são anunciadas como “indetectáveis”.

Função do médico

Atenção para o precedente que calha bem em ações contra operadoras que passam ao largo da fiscalização (?) da Agência Nacional da Saúde Suplementar. Duas frases objetivas de uma sentença: “Não cabe ao plano de saúde decidir como deve ser tratado o paciente, pois esta é função do médico de confiança que o assiste. É abusiva a negativa de tratamento sob a alegação de não estar previsto no rol de procedimentos da ANS”.

O entendimento é do juiz Marcos Aurélio Gonçalves, da comarca de Nazaré Paulista (SP), ao condenar a Notre Dame Intermédica Saúde a indenizar uma mulher diagnosticada com Doença de Chron. Esta é uma condição inflamatória crônica do trato gastrointestinal. (Processo n° 1001520-27.2023.8.26.0695).

Desvantagens na advocacia

A proporção de advogados na menor faixa salarial da categoria é maior entre negros e mulheres, segundo levantamento do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que traçou perfil dos profissionais do País. Os dois segmentos também são mais jovens e têm menos tempo de carreira, o que pode indicar uma recente democratização da profissão, apesar do quadro de desigualdade. Mas o menor período de atuação não justifica os menores salários, avalia a entidade.

No sentido inverso, mais homens e pessoas brancas atingem faixas maiores de renda e tempo de profissão. Os dados são do 1° Estudo Demográfico da Advocacia Brasileira.

Onze de fora

A Comissão Executiva Nacional do 2º Concurso Público Nacional Unificado para ingresso na carreira da Magistratura do Trabalho realizou, na quinta-feira, 13 de junho, sessão pública de divulgação do resultado da prova oral. Das 240 candidaturas habilitadas a participarem das arguições, 229 foram aprovadas e estão aptas a tomarem posse como juízas e juízes do Trabalho. As eliminações foram onze.

Os (as) aprovados (as) na recente etapa serão submetidos à quinta fase do certame. Esta tem caráter apenas classificatório, com a análise dos títulos enviados na terceira etapa.

Igualando o Afeganistão

O Projeto de Lei n° 1.904, que tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados, quer equiparar a punição para o aborto à reclusão prevista em caso de homicídio simples.

Se aprovado, deixará a legislação do Brasil tão dura quanto em países como Afeganistão, El Salvador e Indonésia. Estes são conhecidos por organizações internacionais por suas rígidas leis antiaborto e violações sistemáticas dos direitos das mulheres.

O texto que está na Câmara quer colocar um teto de 22 semanas na realização de qualquer procedimento de aborto em casos de estupro. E abre margem para incluir outros casos em que a interrupção é autorizada no Brasil, como anencefalia fetal e risco à vida da mãe.

Poderosos, curiosos e outrem…

Estamos a 10 dias do início do 12° Fórum de Lisboa, evento tradicionalmente liderado por Gilmar Mendes e realizado na capital portuguesa. Os organizadores preveem recorde de participantes para o evento de 26 a 28 de junho. O tema deste ano é “Avanços e recuos da globalização e as novas fronteiras: transformações jurídicas, políticas, econômicas”.

Informalmente conhecido como “Gilmarpalooza”, estima reunir cerca de 2 mil pessoas. São políticos, empresários, advogados, magistrados, acadêmicos, lobistas, puxa-sacos, poderosos de várias latitudes e curiosos em geral. (Em tempo: Gilmar deve ficar no Supremo mais seis anos e meio; ele completa 75 anos de idade em 30 de dezembro de 2030).

“Circo midiático”?

Sentença proferida pela juíza Rosana Ferri, na 24ª Vara Cível Federal de São Paulo, rejeitou ação judicial dos herdeiros da ex-primeira-dama Marisa Letícia contra a União. Ela pediu indenização moral pela divulgação de grampos telefônicos oficiais de conversas suas com familiares, ao longo de fevereiro de 2016. A ação tramita desde 25 de abril daquele ano. A autora faleceu em 3 de fevereiro de 2017. Foi, então, substituída no polo ativo pelos filhos.

O pedido indenizatório calcado na alegada ocorrência de “circo midiático” foi pela pública divulgação de conversas telefônicas entre Marisa e Lula. Diálogos entre os dois tinham sido interceptados em ação criminal conduzida pelo então juiz Sérgio Moro, da Lava Jato. Detalhe: um dos signatários da petição inicial da ação indenizatória foi o então advogado Cristiano Zanin Martins. Desde 3 de agosto de 2023, é ministro do STF. (Processo n° 0009106-38.2016.4.03.6100).



Fonte: Jornal do Comércio

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