Lorena Hakak, doutora em economia e professora da FGV. Atua como presidente da GeFam (Sociedade de Economia da Família e do Gênero)
Madonna é um ícone. Ninguém discorda disso. Quem nunca cantou e dançou ao som dos seus sucessos? Tendo presenciado o mega show que fez no Rio de Janeiro no dia 4 de maio, é notável como ela, aos 65 anos, é uma daquelas pessoas que impressiona. A sua longeva carreira me faz pensar como o aumento na expectativa de vida vem impactando o mercado de trabalho.
As mulheres enfrentam mais percalços no mercado de trabalho do que os homens, principalmente devido ao que chamamos de penalidade pela maternidade. Como principais cuidadoras, as mulheres acabam, em média, trabalhando menos horas e ganhando menos. Muitas vezes, elas também se afastam do mercado de trabalho por períodos que superam a licença maternidade. Essa realidade é amplamente documentada pela literatura empírica. Porém, há um outro fator que pode afetar a saúde e a produtividade do trabalho das mulheres, principalmente daquelas entre 45 e 55 anos: a menopausa.
O início oficial da menopausa ocorre quando a mulher fica 12 meses consecutivos sem menstruar. Durante essa transição, entre o fim do período fértil e o início da menopausa, as mulheres podem ser acometidas por uma série de sintomas. Dentre os principais temos, fogachos, dores de cabeça, mudanças de humor, ansiedade, depressão, redução da concentração, insônia, entre outros. Além disso, a menopausa pode afetar os níveis de colesterol, aumentar as chances do desenvolvimento de doenças cardiovasculares e osteoporose, por exemplo. Ou seja, é um banho de água fria para as mulheres que hoje vivem mais e querem viver melhor. Felizmente, existem tratamentos para reduzir esses efeitos. A literatura médica apresenta ampla evidência de como a reposição hormonal, quando indicada, é benéfica para reduzir ou até eliminar esses sintomas, além do uso de outros medicamentos e da prática de atividade física.
Segundo o artigo “The menopause penalty” de Gabriella Conti, Rita Ginja, Petra Persson e Barton Willage, o início da menopausa impacta negativamente o nível de emprego e renda das mulheres na faixa de 55-64 anos, além de provocar um aumento temporário na demanda pelos serviços do sistema de saúde. Isso sugere que a menopausa não só é um choque negativo na saúde da mulher, como também na produtividade do trabalho. Para fazer essa análise, os autores conseguem cruzar informações de saúde e mercado de trabalho de indivíduos da Suécia e Noruega. Infelizmente, esses dados não estão disponíveis no Brasil.
Apesar desses países terem um maior nível de desenvolvimento econômico e maior participação feminina no mercado de trabalho, os resultados obtidos no artigo mostram que os efeitos negativos do início da menopausa se concentram principalmente nas mulheres com escolaridade igual ou inferior ao ensino médio. Uma das explicações para esse efeito heterogêneo é a maior procura pelo sistema de saúde das mulheres com mais anos de escolaridade, o que pode significar a busca por tratamento.
Inclusive, há um aumento no uso de longo prazo de drogas para a reposição hormonal e no uso de antidepressivos. Um outro ponto é que a queda da renda é acompanhada por um aumento de licenças e afastamentos, o que pode ser traduzido, segundo os autores, como uma transição para a aposentadoria.
Observando os dados do 4° trimestre da PNADC (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua realizada pelo IBGE) entre 2012 e 2023, houve um aumento de 18,8% da taxa de participação no mercado de trabalho de mulheres entre 55 e 64 anos (de 35% para 42%) enquanto para os homens (de 67% para 68%) foi de menos de 2%. Considerando que para mulheres de 50 a 59 anos a participação em 2023 era de 56%, e as regras de aposentadoria mudaram, é esperado que esse aumento continue nos próximos anos.
Os resultados apresentados no artigo, se trazidos para o Brasil, devem preocupar nossos gestores. Se, para uma realidade bem diferente da nossa, os efeitos negativos no mercado de trabalho recaem em mulheres com menor escolaridade, é importante que o poder público e os gestores de saúde fiquem atentos a isso. Até porque, cerca de 80% das mulheres nessa faixa de idade têm formação até o ensino médio. É importante que o SUS esteja preparado para atender essa população para que esse aumento da participação feminina no mercado de trabalho continue a crescer. A economia agradece.