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Casa arquitetada por Oscar Niemeyer tem alma modernista resgatada em Ilhabela

Casa arquitetada por Oscar Niemeyer tem alma modernista resgatada em Ilhabela




A última residência concebida pelo mais famoso arquiteto brasileiro passou por renovação comandada pelos escritórios AR Arquitetos e Studio Grapa O primeiro ato de Marina Acayaba e Juan Pablo Rosenberg, dupla de arquitetos à frente do escritório AR Arquitetos que, honrosamente, aceitou a tarefa de reformar esta construção de 1986 – restaurando o seu espírito modernista e imprimindo fluidez e beleza, tão necessárias nos tempos atuais –, foi se lançar numa visita ao passado, com direito a lances de adivinhação e incursões arqueológicas. “Procuramos desenhos e detalhamentos para nos orientar. Como encontramos basicamente croquis, passamos a supor, tentando recuperar o pensamento de Oscar Niemeyer na época, o partido arquitetônico, a lógica do projeto”, explica Marina, sobre a última casa feita pelo gênio do movimento moderno brasileiro.
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A amplitude do living deve muito às portas, com desenho original de Niemeyer, que correm pelo longo trecho sem pilares, sobre o piso de cimento queimado no tom areia, para maior continuidade visual com o exterior – o ambiente de estar é composto, da esq. para a dir., por poltrona Jangada, de Jean Gillon, conjunto de banquinhos africanos e mineiros, mesa de tora atribuída a Zanine Caldas, escultura de Paulo Pires sobre o livro branco, vaso do Les 2 Potiers, mesa lateral de Martin Eisler, abajur de Guido Gambone, sofá vintage, almofadas de tecido africano e outras de palha, na Dpot Objeto, e tela de Lore Koch
Ruy Teixeira
Nesse tipo de trabalho temos que ser coadjuvantes e fazer uma espécie de arquitetura do restauro
O trabalho começou quando o galerista Pedro Mendes, sócio da galeria Mendes Wood DM, e a artista visual Sonia Gomes adquiriram o imóvel concebido décadas atrás e resolveram atualizar a edificação bem preservada, mas com alguns elementos intrigantes. “Havia paredes com trechos em ângulo que pareciam inacabados”, elenca Juan Pablo. “Deduzimos que o telhado colonial fora inspirado nas construções típicas da ilha. Por baixo, curiosamente, havia uma laje capaz de suportar grandes vãos”, diz Marina, atribuindo a solução ao Niemeyer típico, conhecido pelas formas plásticas erguidas com concreto. “As janelas dos quartos também não faziam jus às esquadrias bem traçadas da sala de estar. Pesadas, mais lembravam modelos padronizados comuns”, conclui a arquiteta.
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Na entrada da cozinha despontam vasos adquiridos na própria vila de Ilhabela, seguidos do carrinho-bar, de Jorge Zalszupin, com cerâmicas de Roger Capron, e, na parede, escultura de Georges Jouve
Ruy Teixeira
O lavabo tem pia de granito bruto, da Pagliotto Pedras de Cantaria, espelho de Sergio Rodrigues, arandela francesa de Jacques Biny e tela de José Antônio da Silva
Ruy Teixeira
No detalhe do living, gamela antiga e obra de Amadeo Luciano Lorenzato
Ruy Teixeira
Cientes do patrimônio que estavam prestes a alterar – para o bem e para o mal –, Marina e Juan Pablo optaram por assumir lugar de coadjuvantes, artífices da sutileza. Foi assim que os três quartos viraram duas suítes e sala de TV, e a cozinha deixou os fundos para se tornar protagonista, atravessando a planta retangular e térrea. A mudança no layout atendia as necessidades do cliente, interessado não apenas em relaxar no local como também em receber parceiros comerciais e institucionais (um pavilhão na porção de trás do lote, pensado para abrigar artistas residentes, ainda está no papel).
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Na garagem, elemento de concreto da edificação original sombreia as superfícies durante o dia
Ruy Teixeira
A janela tipo óculo havia deixado de funcionar e coube aos arquitetos a restauração da peça de jacarandá, pela qual se enxerga o Pico do Baepi, ponto mais alto da região – na sala de jantar, mesa e cadeiras de Martin Eisler e tela de Abdias do Nascimento, e, na área externa, banco de Hugo França
Ruy Teixeira
A espacialidade ampla e fluida proposta pelo duo de arquitetos casava perfeitamente com os objetos, móveis e obras de arte que Pedro imaginava reunir ali. Nessa hora, a sensibilidade de outro time entrou em cena para compor uma ambientação à altura do apuro estético em vigor. “Examinamos o acervo do morador a fim de escolher quais obras de arte e peças do mobiliário brasileiro dos anos 1950 e 60 seriam ideais”, explica Fernando Pinheiro Guimarães, do Studio Grapa, encarregado dos interiores. Eventuais lacunas ganharam tratamento especial, supridas em viagens, leilões e encomendas específicas – e asseguraram um desejável toque contemporâneo ao conjunto. “Os tecidos das almofadas vieram de Marrakech; a coleção de cerâmica, de Paris”, diz Gabriella Decottignies, sócia e parceira na missão, que destaca outro aspecto importante. “Procuramos um efeito orgânico entre arquitetura e decoração, considerando a área externa, importantíssima na edificação, que, de tão singela, sugere uma simples cobertura para a chuva”, descreve a arquiteta. “Daí os móveis de Zanine Caldas e Hugo França.”
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O quarto ganhou esquadrias novas, do piso ao teto, seguindo o desenho dos exemplares do living – na composição figuram, da esq. para a dir., cesto indígena, cabideiros de Georges Jouve, escrivaninha com cadeira de Martin Eisler, luminária design Clay Michie para a Knoll, tela de Marcos Siqueira, arandela de Charlotte Perriand e, sobre a cama de Pierre Chapo, tecido boro japonês
Ruy Teixeira
A mesma atitude criteriosa e reverente foi adotada pelo encarregado de recuperar os cerca de 2,7 mil m² do jardim criado por Roberto Burle Marx, dobradinha frequente de Niemeyer. Andre Paoliello tratou de recompor o que não resistiu ao tempo, refazer os “morrotes” e canteiros, assim como recuperar a alternância de cores e formas – marca registrada do mestre paisagista.
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O portão marca a transição para a praia, localizada num trecho sossegado do litoral paulista – a área a céu aberto é composta por mesa de Hugo França e cadeiras de Sergio Rodrigues
Ruy Teixeira
Agora, o cenário é vicejante outra vez. Percebe-se a equilibrada simbiose entre dentro e fora, arquitetura e decoração, arte e design, paisagem natural e construída, passado e presente. A reforma foi validada pela própria Fundação Oscar Niemeyer, a quem Marina submeteu o projeto arquitetônico e de quem recebeu, posteriormente, uma carta repleta de elogios – inaugurando um novo momento na história da edificação.
*Matéria originalmente publicada na edição de novembro/2024 da Casa Vogue (CV 467), disponível em versão impressa, na nossa loja virtual, e para assinantes no app Globo Mais.
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Fonte: casa Vogue

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