No Equador, após o terremoto de 2016 que destruiu a província de Esmeraldas, o escritório Rama Estudio projetou e construiu com a população um centro comunitário na cidade de Chamanga, usando bambu e materiais reaproveitados. “Depois de ouvir as famílias, percebemos que, mais do que casas, elas queriam um espaço coletivo para fortalecer a comu nidade”, conta o arquiteto Felipe Donoso, um dos sócios do escritório. “Aprendemos ainda que nem sempre as pessoas afetadas precisam de apoio técnico. Naquele momento, íamos muitas vezes só para conviver com as crianças que estavam vivendo em barracas e passando um momento difícil”, lembra. “Elas viam em nós pessoas com quem podiam esquecer a realidade por um momento e simplesmente brincar, conversar, rir. Não importava se você era arquiteto ou tinha qualquer outra profissão.” Sabemos que os efeitos de eventos extremos na vida das pessoas atingidas vão além de perdas materiais. Quem perde um parente, um animal de estimação, as fotos da família, as memórias afetivas em forma de objetos ou, ainda, o sentimento de pertencimento demora um tempo para processar o que viveu e seguir em frente. “De imediato, o medo de morrer fala mais alto, mas não podemos subestimar essas outras perdas”, diz a psicóloga Nádia Marini, especialista em Saúde Mental e Apoio Psicossocial para a América Latina na ONG Médicos sem Fronteiras Brasil. “A perda dos lugares de referência na nossa cidade é uma questão afetiva. Por isso, é importante que haja rituais coletivos de luto, para homenagear os mortos, por exemplo, e, posteriormente, rituais de reconstrução, como plantar árvores e flores em uma praça”, ela sugere. “Não vemos muito isso no contexto humanitário, nem mesmo a busca por adaptar os abrigos temporários à cultura das pessoas. Fizemos isso nos alojamentos de atendimento a indígenas em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, na época da pandemia. Inserimos elementos da cultura deles nas salas para que se sentissem mais à vontade e funcionou muito bem”, relata Nádia. Mais do que técnica, no fim, quando o assunto é gente, acolher com respeito e empatia é o melhor abrigo possível.