Marcos de Vasconcellos
Jornalista, assessor de investimentos e fundador do Monitor do Mercado
O governo petista acaba de ganhar mais munição para brigar por mudanças na direção da Vale. Dois gigantes internacionais decidiram, na última semana, rebaixar suas recomendações em relação às ações da empresa: Bank of America (BofA) e UBS.
Ambos os bancos recomendavam a compra dos papéis VALE3, mas, nos últimos dias, ajustaram os ponteiros para “neutro”, o que significa que não veem mais boas chances de crescimento.
Esses relatórios são o tipo de coisa que chega nas mãos de quem realmente muda o preço de ações de gigantes como a mineradora e a pontuação do Ibovespa: grandes fundos de investimento internacionais.
Não à toa, os papéis, que haviam subido 5,45% na segunda-feira (8), seguindo a alta dos preços do minério de ferro, desabaram nos dias seguintes, com a divulgação das novas recomendações.
Na sexta-feira, eram novamente negociadas na casa dos R$ 62, justamente o preço-alvo definido pelo último relatório do BofA. Ou seja, para o banco, daí não passa.
Os analistas que assinam o documento apontam que o minério de ferro parece longe de recuperar bons preços; que a Vale deverá aumentar suas provisões para pagar a conta do desastre da Samarco, reduzindo o pagamento de dividendos; e há muitas incertezas sobre quem será seu próximo CEO.
Ter os gringos apontando que o trem da Vale estacionou pode virar um prato cheio para o governo federal, que enfrentou forte resistência ao tentar colocar o ex-ministro da Fazenda petista Guido Mantega no comando da gigante.
Em meio à queda de braço com os conselheiros da empresa, o presidente Lula resolveu escancarar problemas da Vale em rede nacional. Acusou a empresa de ter minas não exploradas há mais de 30 anos e arrematou que “a Vale não pode ter o monopólio”, dando a entender que o governo cogita incentivar concorrentes. Entre outras coisas, que já abordamos aqui.
A briga escalou e fez a mudança na chefia ser adiada para o fim do ano. Agora, o PT tem documentos produzidos pelo próprio mercado financeiro para argumentar que a receita seguida até hoje não fará a Vale voltar a andar. Não pode ignorar, entretanto, que ninguém tem essa fórmula milagrosa em mãos.
Uma simples espiada nos gráficos de cotações deixam claro que, independente de rompimentos de barragens (como as tragédias de Brumadinho e Mariana), trocas de presidente ou entrevistas inflamadas, o preço das ações da Vale dança a música do preço do minério de ferro. E ele acumula uma queda de 23% neste ano e um tombo de quase 40% nos últimos três anos. Commodities vivem de ciclos, como é sabido.
A mudança na chefia esperada para o fim do ano pode ser uma oportunidade de ouro para apresentar um plano claro para a Vale se desvencilhar dos fantasmas do passado e se descolar da simples variação do preço do minério. Até lá, dificilmente alguém vai achar uma boa ideia investir na velha mineradora.