A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira 4 o requerimento de urgência para dois projetos do pacote de corte de gastos encaminhado pelo governo Lula (PT). A decisão foi tomada após uma reunião entre o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e líderes partidários.
Com o reconhecimento da urgência, elas não precisam passar pelas comissões e podem chegar diretamente à votação no plenário.
Uma das propostas que tramitarão em urgência trata do pente-fino no Benefício de Prestação Continuada e no Bolsa Família, além de restringir o reajuste real do salário mínimo aos limites do arcabouço fiscal — ou seja, correção pela inflação e ganho real entre 0,6% e 2,5%. A lei atual propicia um aumento por inflação mais a variação do Produto Interno Bruto. Neste caso, houve 267 votos a favor da urgência e 156 contra.
O outro texto se refere a gatilhos como a proibição de conceder, ampliar ou prorrogar incentivo ou benefício tributário em caso de déficit, além de permitir o bloqueio de emendas parlamentares. O placar foi de 260 pela urgência e 98 contra.
O governo também enviou ao Congresso uma proposta de emenda à Constituição que prevê um corte gradual do acesso ao abono salarial de um salário mínimo por ano. Atualmente, ele beneficia quem recebe até dois salários mínimos, mas isso cairia gradualmente para um salário mínimo e meio. Essa PEC ainda reforça o combate aos supersalários no funcionalismo público.
“Não vamos atropelar em nada a discussão do mérito das matérias. Vamos discutir, a partir da definição do relator”, disse nesta quarta no plenário o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), ao defender a urgência. “Não se trata de retirar direitos. Vamos discutir isso na hora certa.”
O debate sobre o mérito, defendeu Guimarães, deve ocorrer ao longo das próximas três semanas.
Com o plano de corte de gastos, o Ministério da Fazenda projeta economizar 70 bilhões de reais nos próximos dois anos. Até 2030, a meta é poupar 327 bilhões.
Na terça-feira 3, a Câmara adiou a votação dos requerimentos de urgência, em meio à insatisfação dos deputados com a decisão do Supremo Tribunal Federal de impor condições para a liberação do pagamento de emendas parlamentares.
O ministro Flávio Dino decidiu na última segunda-feira 2 autorizar a execução das emendas — bloqueadas desde agosto —, mas enfatizou que o aval depende de cumprir as regras relativas a transparência, rastreabilidade e controle público do dinheiro. Por unanimidade, o plenário do STF confirmou a liminar do relator.
A fim de evitar um atraso ainda maior na aprovação do pacote fiscal, o governo já sinalizou a liberação de 7,8 bilhões de reais em emendas para os próximos dias.
“Vamos nas próximas horas buscar uma solução para a execução das emendas, que são legítimas”, declarou José Guimarães na noite desta quarta. “Estamos fazendo ajustes para permitir que seja restabelecida a autonomia do Parlamento.”
Um dos pontos que incomodam a cúpula do Congresso Nacional é o fato de a Câmara e o Senado terem aprovado no fim de novembro um projeto de lei com novas regras para a proposição e a execução das emendas. O presidente Lula sancionou a lei, sem vetos.
As emendas parlamentares são verbas garantidas pelo governo federal no Orçamento de cada ano. Com elas, deputados e senadores podem influenciar na aplicação do dinheiro de acordo com interesses que julgarem prioritários em seus estados.
Incoformados com as travas para as emendas, parlamentares usam a pressa do governo em avançar com seu ajuste fiscal para pressionar o Palácio do Planalto a intervir na disputa com o STF. Nesta linha, a Advocacia-Geral da União já protocolou um pedido de esclarecimentos na Corte.