O ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas da União (TCU), ignorou um parecer técnico e manteve aberto processo em que o senador Renan Calheiros (MDB-AL) questiona valores firmados em acordos da Braskem pelo desastre causado pela exploração do minério sal-gema em Maceió.
Cedraz é o relator da representação enviada ao TCU pelo congressista. Na última quinta-feira (4), ele definiu que o processo deveria ser analisado pela unidade técnica de meio ambiente do tribunal, em vez do setor de mineração.
Em março, no entanto, um parecer da Unidade de Auditoria Especializada em Petróleo, Gás Natural e Mineração (AudPetróleo) havia defendido o arquivamento do caso.
Os técnicos argumentaram que não havia “providência adicionais” que o TCU pudesse tomar e que, no momento, não se constataram “omissões ou irregularidades” de órgãos federais na apuração de danos causados pela atividade da Braskem.
Renan Calheiros questionou no TCU os acordos fechados pela Braskem com o Ministério Público Federal (MPF) e homologados pela Justiça Federal de Alagoas, argumentando terem valores insuficientes para reparar os danos ambientais.
A exploração do minério na capital alagoana pela empresa causou um afundamento no solo de cinco bairros. Cerca de 60 mil moradores já tiveram que abandonar suas casas. No começo de dezembro, houve a ruptura parcial de uma das minas.
Parecer
Ao analisar o pedido, a AudPetróleo disse não identificar irregularidade no fato de os valores pactuados pela empresa não terem sido fixados nos limites máximos, já que há a possibilidade de novas complementações previstas nos acordos.
Os técnicos também afirmaram que não cabe ao TCU analisar valores de acordos homologados pela Justiça, por se caracterizar possível “tentativa de interferência” e não constar no rol de competência da Corte de Contas.
“A fixação de valor diverso (ainda que complementar) representaria interferência em uma deliberação judicial já prolatada. Isso, contudo, não afasta, conforme já apontado pelo Ministro Relator, a competência deste Tribunal de promover sua própria quantificação e responsabilização por dano ao erário”, diz parecer da unidade técnica.
O documento também cita que a efetiva contabilização do impacto causado pela exploração do minério em Maceió depende da “estabilização das minas e da finalização do processo de fechamento de mina, o que ainda não ocorreu”.
“Eventual tomada de contas especial deve ser instaurada quando esgotadas, sem sucesso, as medidas administrativas para elisão ou recomposição do dano, e subsistindo a existência de elementos fáticos e jurídicos que indiquem a existência ou indício de dano ao erário”.
Decisão
Depois de receber o parecer, Cedraz entendeu que a área que cuida de meio ambiente no TCU é que deveria atuar no processo, por se tratar de dano em área ambiental federal.
O ministro reforçou a necessidade de apuração da “responsabilidade e quantificação dos danos ambientais federais” descritos no pedido de Calheiros, e fala em possível “omissão” de órgãos responsáveis por apurar os danos.
“Se há que se apurar danos ambientais federais, isso se dá pela possível omissão dos órgãos responsáveis, não sendo surpreendente que tais órgãos aleguem não lhes caber essa tarefa, o que reforça a necessidade de que seja promovido o exame crítico das informações encaminhadas por unidade técnica com expertise adequada ao assunto tratado neste processo”, afirmou.
O despacho do relator autoriza a unidade de meio ambiente do TCU a fazer “todas as diligências e inspeções” necessárias para “solução integral do mérito, o que inclui a devida quantificação do débito e identificação dos responsáveis”.
Pedido
A representação do senador chegou ao TCU em maio de 2023. Em dezembro, o ministro determinou as primeiras providências, mandando ouvir a Braskem e órgãos do governo federal sobre as medidas tomadas para calcular os danos e a reparação pela exploração da sal-gema em Maceió.
O ministro também uniu à representação do senador um outro processo, do Ministério Público junto ao TCU, sobre possíveis irregularidades na fiscalização da exploração do sal-gema em Maceió cometidas por órgãos e entidades federais.
Na ocasião, Cedraz também informou que os órgãos do governo poderão ser responsabilizados pela Corte de Contas caso fechem novos acordos com a Braskem “sem a devida quantificação dos danos causados à União” no caso.
Conforme Cedraz, “diversas” ações de controle serão necessárias para apurar a responsabilidade e quantificar os danos relatados, “inclusive por meio da execução de inúmeras inspeções e diligências, da apuração de ocorrência ou não de omissão pelos órgãos e entidades federais responsáveis pela fiscalização ambiental e de atividade minerária, da apreciação da procedência ou não desta representação e de eventual conversão destes autos em tomada de contas especial”.
Na decisão, o ministro entende que há competência do TCU para atuar no caso, pois parte do dano causado pelo afundamento do solo atingiu a Lagoa Mundaú, que é um bem da União.
A questão, no entanto, levantou discussão no meio jurídico. Segundo o advogado Rafael Feldmann, especialista em Direito Ambiental, o TCU “alarga” sua competência ao pedir que seus técnicos ambientais apurem danos causados pela Braskem a Maceió.
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